A união faz a força: como a PAC quer fomentar o associativismo agrícola

O Objetivo Específico 3 da Política Agrícola Comum para os próximos anos pretende melhorar a posição negociadora dos agricultores na geração de valor e o papel das organizações de produtores na cadeia agroalimentar

Favorecer o agrupamento do setor produtivo para ganhar dimensão económica facilitando o poder de negociação com o resto da cadeia e impulsionar uma maior participação dos agricultores na geração de valor das suas produções é um dos objetivos específicos da PAC para os próximos anos.

Fomentar uma maior integração dos produtores primários mediante o aumento da escala económica, a concentração e a oferta de serviços das organizações de produtores (OP), em particular das mais pequenas, e promover o reconhecimento destas organizações de produtores em setores que ainda não estão reconhecidas ou onde a sua expressão é baixa são aspetos que a Política Agrícola Comum procura.

O Objetivo Específico 3 da PAC 2023-2027 procura uma maior integração dentro do setor produtivo para melhorar a posição dos agricultores na cadeia de valor

Ao longo das últimas décadas temos assistido a diferentes processos de integração dentro de cada um dos agentes da cadeia, como mecanismo necessário para aumentar o valor das diferentes produções. Mas, da análise dos estudos realizados tanto a nível europeu como nacional, conclui-se que o setor produtivo da cadeia de valor caracteriza-se, em geral, ainda pela sua dispersão e dimensão reduzida e que esta integração tem sido desigual.

Agrupamento da oferta

Para combater esse desequilíbrio, torna-se necessário aplicar mecanismos que incidam de forma decidida no agrupamento da oferta desde o setor produtivo. Perante uma concentração cada vez maior da procura, agrupar a oferta fortalece a posição dos produtores no mercado.

As organizações de produtores constituem um dos principais instrumentos organizativos de melhoria da posição do agricultor na cadeia alimentar

Existem mecanismos que já estão a ser aplicados, na atual PAC, como as organizações de produtores, as suas associações ou as organizações interprofissionais, e outras a nível nacional, como o fomento da integração cooperativa e de outras entidades associativas de carácter agroalimentar (Lei nº 119/2015, de 31 de agosto, do Código Cooperativo, e  Decreto-Lei n.º 335/99, de 20 de agosto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 23/2001 de 30 de janeiro, do Certificado de Natureza Agrícola), mas que precisam ser melhoradas e mais desenvolvidas.

Portanto, é evidente a necessidade de contar com ajudas que fomentem a integração do produtor, que garantam que o seu poder de negociação está equilibrado com o resto dos agentes e que possa obter um valor adequado pelas suas produções.

A concentração da oferta permite desenvolver economias de escala para reduzir os custos de produção e favorecer o acesso à tecnologia

O agrupamento da oferta nestas organizações de produtores constitui uma necessidade para aumentar o nível de associacionismo entre os produtores agrícolas e reforçar a sua posição no mercado. Permite também melhorar as explorações agrícolas, algo imprescindível para que os produtores primários aumentem a sua competitividade, mediante o desenvolvimento de economias de escala capazes de reduzir os custos de produção e favorecer o acesso a investimentos em tecnologia, em muitos casos inalcançáveis por parte de agricultores individuais.

Participação nos processos de transformação

Paralelamente às medidas para que o setor produtivo ganhe dimensão, a PAC defende também a sua participação no seguinte segmento da cadeia: o da transformação. É necessário utilizar os instrumentos da PAC (apoio aos investimentos, formação, etc.) para possibilitar que os agricultores dêem um maior valor acrescentado às suas produções através de processos de transformação, e assim contribuam mais para o valor global gerado na cadeia.

A indústria transformadora vinculada ao segmento produtivo tem dimensão reduzida e geralmente baixa competitividade

Assim, é preciso desenvolver formas que melhorem os processos de transformação e comercialização dos produtos agrários. Constata-se que a indústria transformadora vinculada ao segmento produtivo tem dimensão reduzida e geralmente baixa competitividade, ao mesmo tempo que normalmente compete com grandes grupos industriais e vende a sua produção a grandes empresas da distribuição.

Geração de valor e repartição justa

A melhoria do funcionamento das relações entre os agentes da cadeia passa por uma repartição justa do valor gerado. Mas é frequente os agricultores terem pouco poder de negociação e poucas opções alternativas para vender (na maior parte dos casos o setor produtivo trabalha com produtos perecíveis pelo que precisa uma comercialização ágil), enquanto os operadores seguintes, cada vez mais concentrados, estão em situação de exercer o poder que lhes reforça a sua posição privilegiada.

A transposição da Diretiva (UE) 2019/633 de Práticas Comerciais Desleais procura melhorar a posição dos agricultores na cadeia alimentar

Existem evidências de assimetrias no poder de negociação entre os operadores da cadeia alimentar, que derivam numa falta de transparência nos processos de formação e negociação dos preços. Estas assimetrias podem acarretar práticas comerciais desleais que afetam a competitividade do setor agroalimentar. Estas práticas tornam necessária a redução dos desequilíbrios na cadeia de valor para melhorar a posição dos agricultores na mesma.

As práticas comerciais abusivas distorcem o mercado e dificultam uma repartição de valor adequado

As práticas comerciais abusivas distorcem o mercado, dificultam uma partilha de valor adequado na cadeia e impedem a sustentabilidade económica e social do setor produtivo. O Governo português tem posto em marcha a PARCA (Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar, estabelecida pelo Despacho conjunto dos Ministérios da Economia e do Emprego e da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território n.º 15480/2011, de 15 de novembro; alterado pelo Despacho n.º 7707/2015, de 6 de julho), que foi criada para fomentar a equidade e o equilíbrio da cadeia alimentar, promovendo o diálogo para permitir o aumento da transparência do mercado e o equilíbrio na distribuição de valor entre os diferentes setores da produção, da transformação e da distribuição de produtos agrícolas e agroalimentares.

Transparência e interlocução em Organizações Interprofissionais

No novo período da PAC quer-se reforçar os mecanismos de melhoria do funcionamento das organizações de produtores, das associações e das organizações interprofissionais. Deste modo quer-se dar um papel mais relevante a estas figuras, como aos seus mecanismos de autorregulação, em sintonia com a Diretiva (UE) 2019/633 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de abril de 2019, relativa às práticas comerciais desleais nas relações entre empresas na cadeia de fornecimento agrícola e alimentar e que pretende melhorar as relações numas condições de negociação justas.

As interprofissionais constituem um foro permanente de encontro e debate entre os diferentes agentes, atingindo um nível de colaboração capaz de gerar sinergias benéficas para todos

O fomento dos contratos por escrito entre os diferentes operadores da cadeia, deve ser acompanhado de maior transparência e interlocução entre os diferentes agentes, potenciando as organizações interprofissionais para que incluam a todos. Hoje em dia o número de Organizações Interprofissionais (OI) reconhecidas é só de 5 (AIFO — Associação Interprofissional da Fileira Olivícola; ALIP – Associação Interprofissional do Leite e Lacticínios; CASA DO ARROZ – Associação Interprofissional do Arroz; VINIPORTUGAL Associação Interprofissional para a Promoção dos Vinhos Portugueses; FILPORC — Associação Interprofissional da Fileira da Carne de Porco), quando em países vizinhos como Espanha este número chega a 26.

Na atualidade são reconhecidas 5 organizações interprofissionais

O objetivo básico que se pretende atingir através da implantação e desenvolvimento das organizações interprofissionais é o fomento do diálogo e a ação comum em interesses que afetem um segmento concreto do setor agroalimentar, mas as organizações interprofissionais agroalimentares reúnem quase todos os agentes da cadeia alimentar, que nem sempre têm os mesmos interesses.

Potenciação das Organizações de Produtores

A PAC até 2027 volta  a reconhecer o papel fundamental das organizações de produtores, apresentando-as como estruturas chave para desenvolver a cooperação setorial e melhorar a posição dos produtores na cadeia de valor. E, seguindo o modelo dos programas operativos de frutas e hortícolas, inclui-as como entidades beneficiárias no alvo das possíveis intervenções setoriais que os Estados Membros podem decidir nos seus Planos Estratégicos.

Portugal tem 122 Organizações de Produtores (OP) reconhecidas, a maior parte delas nas regiões agrícolas de Lisboa, Vale do Tejo e Alentejo

Portugal tem 122 Organizações de Produtores (OP) reconhecidas. A listagem inclui organizações de produtos como vinho, frutas e produtos hortícolas, cereais, carne, arroz, leite e produtos lácteos de vaca, azeite, frutos de casca rija, produtos apícolas, bananas, flores ou batata. A maior parte delas (dois terços das existentes) encontram-se nas regiões agrícolas de Lisboa, Vale do Tejo e Alentejo.

As organizações de produtores contribuem para minimizar os riscos, assegurando, entre outras coisas, relações comerciais estáveis, segurança de pagamentos, investimentos, apoio em situações de crises de mercado e comercialização de toda a produção dos membros.

Têm, portanto, um papel relevante na hora de garantir que a produção se planifique e se ajuste à procura, sobretudo no que respeita à qualidade e quantidade, à concentração da oferta, comercialização dos produtos dos seus membros, otimizar e estabilizar os custos de produção e os benefícios dos investimentos realizados em resposta a normas relativas ao meio ambiente e ao bem-estar dos animais.

No caso do setor leiteiro, o reconhecimento das organizações de produtores por parte dos Estados Membros tem um caráter obrigatório. Portugal conta com cinco Organizações de Produtores de Leite e Produtos Lácteos de vaca, situadas no Continente, nomeadamente na zona norte e centro. São elas: Agros (Argivai-Póvoa de Varzim), Proleite (Oliveira de Azeméis), Leite do Campo (Rates- Póvoa de Varzim), Lacticoop – União Cooperativas Produtores Leite entre Douro Mondego (Aveiro) e Cooperativa Pingo de Leite (Estarreja).

Intervenções setoriais obrigatórias na nova PAC: frutas e hortícolas, vinho e produtos apícolas

As Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas são as entidades setoriais associativas mais desenvolvidas no contexto europeu. Portugal conta com 77 Organizações de Produtores de Frutas e Hortícolas e é o sexto país europeu com maior número depois de Espanha (572), Itália (301), França (227), Polónia (197) e Grécia (131).

“Num mercado como o alimentar, a organização da produção permite mitigar desequilíbrios na cadeia. Os Programas Operacionais do Setor das Frutas e Hortícolas (que representam o 2% do PF) e o incentivo à criação de OP são instrumentos vocacionados para este domínio”, defende o Governo no Plano Estratégico da PAC 2023-2027 enviado à Comissão Europeia em dezembro.

A balança comercial de Portugal para frutas, hortícolas e flores mostra um saldo negativo no ano 2020 em 105 milhões de euros, segundo os dados do Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral. Contudo, Portugal melhorou notavelmente nos últimos 20 anos a sua balança comercial neste setor, passando de uma cobertura exportações-importações do 40% em 2000 ao 94% no 2020.

Portugal conta com 77 Organizações de Produtores de frutas e hortícolas

No entanto, os trabalhos de diagnóstico prévios ao processo de elaboração do Plano Estratégico têm posto em evidência uma série de debilidades do setor que devem ser abordadas: dependência do mercado comunitário e concorrência com terceiros países, baixo nível de ajudas procedentes da PAC, desigual grau de organização, importante dependência da distribuição ao serem produtos perecíveis e principalmente destinados ao consumo em fresco ou altos custos de produção.

O acordo final depois dos trílogos (reuniões entre Parlamento Europeu, Comissão Europeia e Conselho), respeita os regimes de ajuda setoriais específicos vigentes até agora no Regulamento da Organização Comum dos Mercados Agrários, incorporando-os ao Regulamento de Planos Estratégicos da PAC 2023-2027, que estabelece no seu artigo 43 que o tipo de intervenção no setor de frutas e hortícolas é obrigatório para todos os Estados membros que contem com organizações de produtores neste setor, reconhecidas em virtude do Regulamento (UE) nº 1308/2013.

Além disso, o Regulamento (UE) nº 1308/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013,  estabelece a obrigação de que os Programas Operativos incluam duas ou mais ações meio ambientais ou no mínimo 10% da despesa correspondente aos programas operativos se destine a ações ambientais.

Intervenção Setorial no Setor do Vinho

Na Política Agrícola Comum para o período 2023-2027 dá-se continuidade também a outras intervenções setoriais obrigatórias que já faziam parte da PAC 2014-2020, tais como o setor do vinho e a apicultura. O Regulamento PEPAC estabelece no seu artigo 43.3 que o tipo de intervenção no setor do vinho é obrigatório para todos os Estados Membros incluídos no Anexo VII. Portugal encontra-se nesta situação.

O objeto desta intervenção setorial é aliviar as debilidades detetadas no setor do vinho em Portugal e adaptar-se à mudança climática, com uma orientação para modelos mais sustentáveis de produção e conseguir um equilíbrio entre a oferta e a procura, além de acrescentar valor na produção.

No setor do vinho, em 2020 as exportações portuguesas alcançaram 847 milhões de euros, com um saldo positivo de 683 milhões de euros face às importações. Portanto, o setor vinícola português tem uma clara vocação exportadora.

A intervenção setorial do vinho deve dar cumprimento a 5% de despesa obrigatória estabelecido no artigo 60.4 do Regulamento de Planos Estratégicos da PAC para a proteção do meio ambiente, contribuir para a adaptação à mudança climática e sua mitigação, melhoria da sustentabilidade dos sistemas de produção, em particular mediante ajudas aos produtores de vinho para reduzirem o uso de produtos fitofarmacêuticos e apliquem métodos e práticas de cultivo mais respeitadoras do meio ambiente.

Intervenção Setorial no Setor Apícola

O papel do setor apícola na biodiversidade é inquestionável e assim tem ficado refletido nos documentos da nova PAC e na Estratégia de Biodiversidade 2030, apresentada pela Comissão Europeia em maio de 2021. Pela sua própria natureza, as abelhas são os polinizadores naturais mais importantes na maioria dos ecossistemas, e como tal a UE pretende favorecer sua volta às terras agrícolas com medidas como a redução de pesticidas.

Dentro desta intervenção setorial obrigatória na PAC, incluem-se várias medidas que os apicultores e as suas organizações poderão realizar, tais como serviços de assessoria, assistência técnica, formação, informação e intercâmbio de melhores práticas; investimentos em ativos materiais; bem como outras ações, incluindo as destinadas a lutar contra os invasores e as doenças das colmeias, em particular a varroa; prever os danos provocados  por fenómenos climáticos adversos e fomentar o desenvolvimento e a utilização de práticas de gestão adaptadas a alterações climáticas e racionalizar a transumância.

Os Estados Membros deverão também estabelecer medidas para favorecer a difusão e promoção dos valores dos produtos apícolas junto dos consumidores. Por sua vez tal permitirá incrementar a produção apícola e sua função polinizadora sobre a produção agrária.

Intervenções setoriais de tipo voluntário

Os Estados Membros podem estabelecer no seu Plano Estratégico Nacional para a PAC 2023-2027 intervenções setoriais especificamente destinadas a melhorar a gestão e procurar modelos de produção mais eficientes.

As intervenções setoriais de tipo voluntário noutros setores estão dirigidas ao apoio de ações a levar a cabo exclusivamente por Organizações de Produtores, ou também através de outras figuras associativas, como as cooperativas, que num período transitório se constituam em OP.

Este tipo de ajudas são muito diferentes dos pagamentos associados, pois os fundos vão dirigidos às Organizações de Produtores e não diretamente aos titulares das explorações. Igualmente, as OP devem cofinanciar a realização das atividades e objetivos previstos nos respetivos programas operativos que se desenhem, para o que necessitam de capacidade de investimento.

 

Artigo publicado originalmente em Voz do Campo: https://vozdocampo.pt/2022/02/10/a-uniao-faz-a-forca-como-a-pac-quer-fomentar-o-associativismo-agricola/

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